segunda-feira, 9 de abril de 2012

Hora de revalorizar a Embrapa




Não há como entender a transformação do Brasil numa potência agrícola, capaz de produzir muito e com muita eficiência, sem levar em conta a contribuição da Embrapa, celebrada durante anos como um dos principais institutos de pesquisa agropecuária de todo o mundo



Não há como entender a transformação do Brasil numa potência agrícola, capaz de produzir muito e com muita eficiência, sem levar em conta a contribuição da Embrapa, celebrada durante anos como um dos principais institutos de pesquisa agropecuária de todo o mundo. Mas a Embrapa é hoje bem menos importante do que foi durante um quarto de século, desde sua criação nos anos 70. Perdeu relevância como fornecedora de sementes, num mercado há vários anos dominado por grandes empresas multinacionais, e, na era Lula, deixou de receber do próprio governo a atenção e os recursos necessários a um trabalho relevante de pesquisa, de inovação e de criação de oportunidades para a produção rural brasileira. 


Durante anos, a empresa liderou as pesquisas relevantes para o Brasil, contribuindo para a expansão de culturas novas e comercialmente importantes, como a soja, para o aumento da produtividade de lavouras essenciais para a dieta do brasileiro, para o barateamento da alimentação e também - dado nem sempre lembrado - para a ocupação produtiva de novas e amplas porções do território, como as enormes áreas de Cerrado. 

Depois de anos de liderança, cumprindo uma função estratégica da máxima importância, a Embrapa começou a perder terreno. Demorou, por preconceito de seus dirigentes, a avançar na pesquisa de transgênicos, enquanto o setor privado se expandia velozmente nessa área científica e tecnológica. Quase ficou sem rumo, quando o primeiro governo do presidente Luiz Inácio Lula da Silva ensaiou submetê-la à sua política de aparelhamento político. Mas, quando isso ocorreu, sua presença no mercado de sementes já havia sido consideravelmente reduzida, em consequência de mudanças no financiamento das lavouras. 

Nos últimos 20 anos, empresas privadas, principalmente multinacionais fornecedoras de sementes e de insumos agroquímicos, assumiram crescente importância no financiamento do custeio agrícola. Isso alterou a ordem dos procedimentos. Tradicionalmente os agricultores tomavam empréstimos bancários - oficiais, na maior parte - e em seguida compravam as sementes, fertilizantes e defensivos para o plantio e para o trato das lavouras. Muitos ainda seguem esse roteiro. Um grande número, no entanto, passou a negociar diretamente com as empresas fornecedoras de insumos. 

Como parte do novo sistema, esses produtores passaram a vender antecipadamente a safra, ou parte dela. Pode ter sido uma solução cômoda para agricultores e para a indústria, e uma das consequências da mudança foi a criação de um mercado cativo, ou quase, para as sementes desenvolvidas pelo setor privado. 

Essa mudança havia começado antes da difusão dos transgênicos, como observa o agrônomo e economista José Sidnei Gonçalves, pesquisador do Instituto de Economia Agrícola do governo paulista. Sem participar do novo padrão de financiamento, a genética desenvolvida pelo setor público ficou fora do jogo. "Ao menos para as grandes lavouras, o trem-bala do capital financeiro fechou as portas ao custeio da safra, fechou as portas na cara da pesquisa pública", comenta o pesquisador. 

A Embrapa e outros institutos públicos de pesquisa e difusão de tecnologia contribuíram de forma decisiva para a criação de uma agropecuária moderna e competitiva no Brasil. Mas o setor privado, munido tanto de um sistema de pesquisas quanto de um eficiente aparelho comercial e financeiro, implantou um novo jogo, enfraquecendo os vínculos entre as entidades públicas e o mercado. O corte do orçamento da Embrapa e as mudanças de orientação do governo contribuíram de forma adicional para a sua perda de relevância. 

É hora de repensar a missão da Embrapa e as formas de financiar suas atividades. Não tem sentido separá-la do mercado e da linha ambiciosa de trabalho seguida com sucesso durante décadas, mas é preciso replanejar seu papel estratégico e sua posição no sistema produtivo. Será o caso de abrir seu capital, como já se propôs? Não é fácil a resposta, mas seria um erro grave descartar essa hipótese por mero preconceito. É preciso pensar o futuro da Embrapa com criatividade e ousadia à altura de sua história.

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